Da colcha de retalhos a 10 mil empresas de confecção, como a cidade costurou o próprio destino em cinco décadas
Santa Cruz do Capibaribe foi emancipada à condição de cidade apenas em 1953. Na época, vivia como tantos outros municípios do agreste pernambucano da agricultura de subsistência, com plantações de feijão e milho. Mas as mulheres mantinham a tradição de costurar colchas de retalhos, feitas de aparas de tecidos que, no final dos anos 1940, eram vendidas por comerciantes locais.
A rotina foi alterada quase 20 anos depois, quando os caminhões que levavam mercadorias do nordeste para o sul, retornavam cheios de retalhos. Ali começava o mito da Sulanca. Talvez não fosse apenas helanca que os caminhoneiros traziam. Mas, com certeza, o tecido constituía a maioria dos retalhos.
Não se sabe ao certo como nem quem ou por que, os retalhos maiores serviram para costurar shorts para crianças. Faltava dinheiro, porém, para comprar elástico para o cós. As costureiras de Santa Cruz do Capirabibe exerciam o ofício da reinvenção com criatividade. Usaram lâminas cortadas das câmaras de ar de pneus de Fusca que iam para o lixo, conta José Augusto Maia, presidente do Moda Center e atual secretário de Indústria, Comércio e Turismo da cidade.
Quando chegaram os retalhos maiores, suficientes para fazer shorts de adulto, as lâminas era tiradas das câmaras de ar velhas daqueles jipes usados para transporte de passageiros muito usados no nordeste. Antes de reciclagem ser moda, a população da cidade dava destinação eficiente às sobras. Os shorts eram vendidos bem baratos nas feiras.
A ideia espalhou-se pelas costureiras da região e enquanto as mulheres costuravam, os homens percorriam as feiras da região para vender o produto de preço sem concorrência. Dos shorts, passaram a fazer saias, blusas, camisas, conjuntos infantis e lingerie.
Produção diversificada
A produção de vestuário em Santa Cruz Capibaribe evoluiu muito desde então. Hoje, é diversificada, incluindo produção de roupa de malha, moda praia, lingerie, algum jeans, modinha e algumas lavanderias de jeans. De acordo com Maia, 65% do que o pólo do Agreste Pernambucano produz saem da cidade. O município também concentra grande força comercial, que por muito tempo foi sustentada pela feira semanal de rua repleta de barracas vendendo roupa, lingerie e acessórios.
A cidade construiu um centro comercial – o Moda Center – que tirou as empresas da feira de rua. Elas passaram a ocupar um espaço fechado com nada menos de 120 mil metros quadrados de área coberta, que abriga 10 mil pequenos e médios empreendimentos atendendo o varejo e o atacado, diz Maia.
O exemplo de Santa Cruz do Capibaribe foi uma das referências para que Toritama também se reinventasse, quando a produção artesanal de calçados foi a pique, não resistindo ao avanço tecnológico industrial.
foto: divulgação