Relatório brasileiro analisa a produção de algodão, poliéster e viscose no país sob a ótica da economia circular para a moda.
Saiu o primeiro relatório brasileiro que analisa os impactos socioambientais da produção das três fibras têxteis mais utilizadas pela indústria da moda – algodão, poliéster e viscose. O estudo também avalia o potencial de circularidade dessas três fibras produzidas no país. A abordagem tem caráter ainda mais inédito ao analisar os impactos considerando as peculiaridades brasileiras, quando a maioria dos estudos reflete realidades de outros mercados.
O relatório Fios da Moda: Perspectiva Sistêmica para Circularidade é uma iniciativa do Modefica, site de jornalismo especializado em assuntos de sustentabilidade; do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas (FGVCes); e a consultoria internacional Regenerate Fashion.
Foi um dos projetos selecionados pelo edital global da Laudes Foundation (anteriormente Instituto C&A) ‘Fazendo a transição para uma indústria da moda circular e inclusiva’, lançado em 2019. A fundação garantiu o aporte financeiro para a realização do estudo.
“A vontade de produzir um relatório sobre fibras têxteis está ligada à urgência da transformação que precisamos fazer acontecer na próxima década se quisermos garantir condições de vida minimamente estáveis na Terra frente a um cenário climático em profunda transformação”, escreveu Marina Colerato, coordenadora do projeto e fundadora do Modefica, ao apresentar o relatório.
ASPECTOS CONSIDERADOS
O estudo considerou diferentes fontes de dados, abertas e disponíveis. Também recorreu à Lei de Acesso à Informação.
O algodão é uma fibra natural, de origem vegetal. O poliéster é uma fibra derivada do petróleo e a mais empregada pela indústria da moda. Corresponde a mais da metade da produção global de fibras para uso têxtil, ressalta o relatório citando dados de 2018 do Textile Exchange que estima o volume mundial em 107 milhões de toneladas. Dos quais o poliéster sustenta 52,5%.
Viscose é a principal fibra artificial, obtida a partir da celulose, extraída da madeira. “Dada a natureza desta fibra, as práticas sustentáveis e alternativas de produção de viscose devem incluir não só o cuidado ambiental com a floresta nativa, mas também a inclusão das comunidades que vivem e trabalham nestas regiões particulares, com especial atenção às comunidades ribeirinhas, quilombolas e indígenas”, recomenda o relatório.
São poucos os dados sobre a produção de viscose no Brasil o que tornou difícil a análise, afirma o estudo. Mas ressalta que 30% da viscose “é proveniente de árvores de florestas nativas e ameaçadas de extinção, incluindo a Amazônia”. Por isso, a recomendação é o uso de viscose produzida por fornecedores “que utilizam adequadamente os recursos naturais e tem compromisso com a não exploração predatória das florestas”, certificados por selos como o Forest Stewardship Council (FSC) e o Canopy.
ALGUNS DADOS EM DESTAQUE SOBRE FIBRAS TÊXTEIS
Algodão | No Brasil, é a quarta cultura que mais consome agrotóxicos, com destaque para o glifosato, produto de alta toxicidade com evidência de carcinogenicidade, diz o estudo. Também acrescenta que a cultura do algodão é responsável por aproximadamente 10% do volume total de pesticidas utilizados em território nacional.
Viscose | Falta de literatura sobre a fibra dificultou a análise de impacto, diz o estudo. Destaca, porém, que as culturas de eucalipto (origem da fibra) utilizam 7 tipos dos agrotóxicos mais vendidos no Brasil.
Poliéster | Principais impactos ambientais associados ao uso de energia e ao uso de combustíveis fósseis. Mas cresce a produção de poliéster reciclado. No Brasil, mais devagar. Por aqui, foram recicladas 311 mil toneladas de PET em 2016, das quais 22% foram destinados à indústria têxtil para produção de tecidos, malhas, cordas e monofilamentos.
RECICLAGEM TÊXTIL
Uma das recomendações do estudo sobre fibras têxteis propõe o fomento da reciclagem têxtil no país como uma dimensão importante na direção da circularidade.
O trabalho incluiu pesquisa com consumidores a fim de verificar os padrões de consumo, uso e descarte das roupas.
87,9% dos consultados fazem doações das roupas que não querem mais para igrejas e projetos sociais.
20,3% das pessoas revendem as peças que não usam mais.
49,9% das pessoas nunca ouviram falar sobre reciclagem de roupas no Brasil.
Desperdício na cadeia de produção | Só na região do Brás, o lixo têxtil enche 16 caminhões por dia. Isso equivale a 45 toneladas de resíduo têxtil por dia, conforme o relatório.