Entre os planos dela está o de criar etiquetas em braile com informações de cor e tecido, para facilitar a vida dos deficientes visuais
Foi o contato próximo com um garoto que teve as duas pernas amputadas e acompanhar as dificuldades dele para comprar roupas adequadas que fizeram a professora de modelagem Oneide de Almeida Carvalho usar seus conhecimentos para desenvolver roupas que pudessem melhorar a vida dos portadores de necessidades especiais tanto em praticidade quanto em estética.
A idéia surgiu do guarda-roupa do seu conhecido. “O menino tinha que comprar calça dois números maior para a prótese passar e ficava larga no quadril. Resolvi fazer uma calça com adaptações na barra e ele mesmo pediu para fazer em tecido camuflado”, conta Oneide.
A professora quis levar a experiência adiante e convidou seus alunos de modelagem da Universidade de Franca (UNIFRAN) para participar de um projeto de iniciação científica. Formou-se um grupo interdisciplinar com oito estudantes – seis de moda, um de fisioterapia e um de computação. O resultado do projeto foi apresentado num desfile de moda, realizado no final de 2005, cujos modelos foram pessoas atendidas pela Associação Batataense de Deficientes Físicos (ABDF), que fica na cidade de Batataes a 40 minutos de Franca.
Por tratar de um tema que tende a gerar piedade nas pessoas, um dos primeiros desafios de Neda foi fazer com que os jovens pesquisadores entendessem os portadores de necessidades especiais como potenciais consumidores dos produtos que desenvolveriam. Outro grande desafio foi desenvolver peças que seguissem as tendências da moda e fossem ao mesmo tempo práticas de vestir. É o que Oneide chama de um design social universal, ou seja, se adequa a todas as pessoas, independentemente do grau de dificuldades na movimentação do corpo. Por outro lado, também foi difícil convencer os portadores de necessidades especiais a desfilar, porque como a maioria encontra problemas na hora de comprar roupas, eles temiam que as roupas evidenciassem as deficiências.
Com ajuda da estudante de fisioterapia, as dificuldades de cada um foram identificadas. “Uma moça contou que não saía de casa porque nenhuma roupa ficava boa. O sonho dela era usar uma blusa que ficasse retinha no quadril. Em função de paralisia cerebral, ela tinha a perna e o braço esquerdos um pouco dobrados e, por isso, todas os tops ficavam assimétricos. Desenvolvemos uma blusa assimétrica em viscolycra. Na hora do desfile, ela estava radiante”, conta a orientadora.
O grupo criou um site que será a vitrine das roupas confeccionadas e onde o deficiente físico vai poder relatar qual a sua necessidade. A equipe coordenada por Oneide confeccionou 12 modelos para a apresentação e ainda há mais 30 moldes prontos, à espera de patrocinadores.
Alguns alunos do grupo expressaram a vontade de continuar nesse caminho. “Uma aluna está desenvolvendo calçados para esse público”, acrescenta a professora. Os portadores de necessidades especiais representam 24,5 milhões de pessoas no Brasil, mais de 10% da população. De acordo com o Censo de 2000, desse total, 9 milhões estão em idade de trabalhar e 1 milhão exercem algum tipo de atividade remunerada. A Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta que o total de pessoas com deficiência no mundo é de 610 milhões, das quais 386 milhões fazem parte da população economicamente ativa.
Hoje, Neda, como a professora é conhecida, dá continuidade ao projeto na tese de mestrado que irá defender no SENAC de São Paulo, pela qual dar um viés mais teórico. “Ainda quero desenvolver etiquetas em braile com informações de cor e tecido, para os deficientes visuais saberem o que estão comprando. Mas até lá é um longo caminho, estou só começando”.