No Brasil começam a brotar experiências, como a de uma grande varejista de moda criando seu próprio metaverso.

Com a exposição favorecida pelo anúncio de Mark Zuckerberg de que investiria na direção de experiências imersivas, o metaverso ganhou tração. Deixou a navegação errática para trás ao acenar com novos estilos de negócios, inclusive para a moda. Isso explica em parte por quê empresas experimentam o metaverso. Brotam no mercado internacional experiências envolvendo marcas de material esportivo, como Nike e Adidas, assim como as de vestuário de luxo, como Gucci, Balmain, Balenciaga ou Ralph Lauren. No Brasil, a
curitibana VRGlass inicia o desenvolvimento de um metaverso exclusivo para uma grande rede varejista de moda.Pelo impacto que espera causar, o projeto é mantido sob sigilo. Fundada em 2011, a VRGlass é pioneira na área, com patente para óculos de realidade virtual que se encaixa no celular, conta Rodrigo Losina, diretor de projeto da empresa. Desde 2020 tem solução de metaverso rodando no browser, ou seja, sem necessidade de baixar aplicativo.
Fora do mercado de moda, a VRGlass desenvolveu um ambiente de metaverso para o lançamento de coleção da Roca, dona marca de porcelanato Incepa, no final de janeiro deste ano.
Em julho de 2021, a empresa desenvolveu evento virtual para transmitir as finais da NBA, que antes era realizado em São Paulo. “Ao longo de todo o mês a plataforma teve mais de um milhão de acessos, com 250 mil usuários únicos. Os participantes tinham acesso ao metaverso com direito a avatares, interação, games, atividades de gamificação, bonificação, coleta de itens”, lembra Losina.
OUTRAS EXPERIÊNCIAS

No Brasil, empresas experimentam o metaverso em ações pontuais na área de moda. Hanne Lima, analista de Customer Experience e especialista em tendências na WGSN, empresa de tendências de comportamento e consumo, cita a loja que a Renner inaugurou no jogo Fortnite de forma a permitir a interação do público, que votava em quais estampas seriam vendidas neste espaço. “Também cito o caso da Alpargatas em maio de 2021 leiloando a NFT Happy Feet por R$5.600, uma das primeiras do Brasil, e da Pantys que se tornou a primeira marca de lingerie do mundo a lançar NFTs, com 33 tokens não fungíveis”, acrescenta a executiva.
A Chilli Beans fez ação no GTA, ao comprar uma ilha para realizar sua convenção de vendas dentro do jogo, recorda Losina.
Fora do Brasil, os exemplos se multiplicam. Recentemente, a Wrangler lançou o primeiro NFT de jeans. No final do mês, a partir de 24 de março, a Decentraland realiza a primeira edição da Metaverse Fashion Week, com a participação de marcas de luxo como Paco Rabanne, Dolce & Gabbana, Etro, Tommy Hilfiger, Cavalli e Elie Saab.
Serão quatro dias de evento no metaverso, com desfiles de coleções digitais, espaço para compras, apresentações e instalações. As marcas vão mostrar novas coleções, além de venderem peças digitais e físicas. A Decentraland é uma plataforma de realidade virtual alimentada pela rede Ethereum (blockchain).
Também há relatos de recuo, como a decisão da NYFW de cancelar a versão em metaverso da semana de moda de New York devido a problemas técnicos. A organização explicou que os servidores sucumbiram ao peso dos arquivos que teriam que rodar para fazer a apresentação das coleções.
MERCADO DE US$800 BILHÕES

Para Fernando Godoy, fundador da Flex Interativa, não se trata de mais uma bolha para o metaverso por uma série de razões. Ele conhece bem o mercado. Fundada em 2008, a empresa 100% nacional especializada em soluções envolvendo realidade virtual e aumentada lançou em 2021 uma das primeiras plataformas de metaverso do Brasil.
Godoy conta que no ano passado nas reuniões de apresentação gastava mais tempo explicando o que era metaverso do que falando sobre o negócio em si. Desde janeiro, a procura explodiu, afirma. “Se fazíamos dez reuniões, agora, fazemos 80”, comenta, afirmando que já não gasta mais tempo com as explicações didáticas.
Ele reconhece que o impulso de mudar a empresa do Facebook para Meta acelerou um processo que já vinha evoluindo. O metaverso usa uma combinação de tecnologias para aproximar o mundo físico do digital que melhoraram recursos e vêm caindo de preço. Godoy menciona realidade virtual, 3D, inteligência artificial e blockchain (a base das criptomoedas).
Outro fator de ruptura foi, diz, o avanço crucial da indústria de games que passou a criar seus próprios metaversos rodando em navegador. Sem necessidade de baixar aplicativo ou usar óculos especiais. Não por acaso se multiplicam os projetos de parceria envolvendo Roblox e Fortinite.
Cada vez mais empresas experimentam o metaverso. Estudo da Bloomberg Intelligence estima que a chamada metaeconomia poderá movimentar US$783 bilhões daqui a dois anos no mercado global. Ou seja, logo ali, em 2024. Considerou para o cálculo dados da Newzoo, IDC, PwC, Statista e Two Circles. Do total, jogos online e hardware de jogos podem ultrapassar, por essa análise, os US$400 bilhões em 2024, “enquanto as oportunidades em entretenimento ao vivo e mídia social compõem o restante”, diz o relatório da Bloomberg.
NOVAS FONTES DE RECEITA
Conforme Hanne Lima, do WGSN, novos estilos de negócios, oportunidades e maneiras de consumir surgem com o metaverso. “Para ilustrar, temos a economia Direto para Avatar (D2A), o mercado de NFTs e todo um novo espaço se estruturando onde pessoas podem se conectar e consumir em novos ambientes imersivos”, diz.
Novas fontes de receita passam pela compra de itens unicamente digitais ou de NFTs, e de peças de moda para os avatares, aponta Hanne. As aplicações no metaverso são, porém, inúmeras, e podem ir além do varejo, considera.
“Para uma tecelagem, por exemplo, o metaverso pode ser um meio de estreitar relacionamentos com os clientes ou com os colaboradores através de plataformas de relacionamento dentro desse universo, ou aumentar o portfólio de produtos para o mundo figital, com a venda de uma versão dos tecidos ou estampas digitais para serem usados em modelagens virtuais”, sugere.
Fernando Godoy, da Flex Interativa, também acredita que os projetos pelos quais as empresas experimentam o metaverso podem seguir caminhos variados.
POTENCIAL DA FERRAMENTA
Um deles seria pela democratização de acesso, como permitir a uma pessoa do Brasil assistir um show em Chicago, sem sair de casa, a um custo menor do que se tivesse que viajar. Ao mesmo tempo, algumas marcas lideram projetos de metaverso como forma de atrair consumidores em busca de status de inovação e exclusividade, como são os NFTs.
“Para ser realidade, o metaverso precisa entregar resultado”, argumenta Losina, da VRGlass. Para Godoy, o metaverso é uma ferramenta “com potencial enorme de melhorar a experiência do cliente em relação à marca”. Ele lembra, contudo, que o mercado permanece até este momento em curva de aprendizado acerca do potencial e limites da ferramenta.